A explicação sobre origens e difusão é tema instigante no universo da Moda e a construção do conhecimento sistemático a seu respeito torna-se importante para o futuro fashion lawyer.

A maior das teorias parte pode ser agrupada num paradigma denominado
teorias do “status” ou “gotejamento”. Segundo estas, a Moda surgiria como
decorrência da necessidade de pessoas situadas em posições sociais inferiores
se colocarem no mesmo plano daquelas de classes superiores. As pessoas “comuns”
buscariam imitar os modos das pessoas destacadas, posicionando-se pelo
vestuário e estilo num estrato social mais elevado.
Situa-se o nascimento da Moda e seu conceito no final da
Idade Média, vez que na Antiguidade não havia preocupação específica com o
fenômeno enquanto questão social. Pode-se, todavia, encontrar em alguns
pensadores a colocação de que o vestuário era algo secundário, por exemplo, em
Platão, quando, ao se referir a Sócrates no Banquete, faz com que um dos personagens
diga que este não se preocupava com a qualidade dos tecidos de sua túnica, nem
em andar calçado.
O desenvolvimento da Moda na Idade Média, contudo, se dá de
forma paradoxal, pois acaba sendo resultado da tentativa de combatê-la. Na
Europa Medieval, dominada por um cristianismo dogmático, exigia-se um aparente
desprendimento com relação ao luxo. Datam desta época as chamadas Leis
Suntuárias, em vigor a partir do século XIII até o século XVII, cujos
dispositivos visavam reprimir o uso ostensivo de objetos e roupas de caráter
luxuoso (suntuário deriva do latim, “sumptuarius”, que significa excessivamente
requintado, de alto custo). Certamente leis como essas existiram anteriormente,
mais não tinham as mesmas características de efetividade normativa.
O fundamento destas normas era, além de preservar a
distinção do status social, a de proteger a moralidade doutoral e peremptória
que entendia o luxo como corruptor da formação humana.
No final do Renascimento, a figura embrionária do burguês
moderno – construída de forma complexa, mas que se resume pela fluidez das
relações socioeconômicas – posiciona o vestuário como condição necessária e
quase suficiente ao convívio social. Isto porque o burguês, que adquirira
posição em virtude de seus ganhos e não de sua ascendência, situava-se no mesmo
plano da nobreza vestindo-se de forma semelhante aos integrantes desta.
Com o desenvolvimento da produção, que chega às massas a
partir do final do século XVIII, a Moda passa ao domínio das pessoas “comuns”,
vale dizer, classe trabalhadora. Neste momento, não em um ponto claro e
específico, a Moda assume seu caráter simbólico como meio de representação
social.
Como há a intensificação da procura de bens simbolicamente
poderosos – simultaneamente causa e efeito da desigualdade social – espalha-se
a ideia de que a inovação em termos de vestuário se daria inicialmente nas
classes superiores, sendo imitada em seguida pelas inferiores.
Citam-se dois autores importantes para esta compreensão. O
primeiro é Kant, cujo texto “Antropologia de um ponto de vista pragmático”
enfatiza ser a Moda fruto da imitação. Para este pensador, todavia, tal
imitação seria decorrente da vaidade, uma vez ausente qualquer valor interno na
conduta de quem imita. Portanto, Moda seria uma questão menor de gosto.
Um segundo filósofo relevante para a construção desse modelo
de pensamento é Georg Simmel, com o ensaio “Filosofia da Moda”. Embora também
haja um componente ético, sua análise aprofunda-se mais acentuadamente em
características históricas e materiais da relação que buscaria o equilíbrio das
necessidades e inclinações humanas sempre em oposição. A Moda seria proveniente
da imitação como orientação básica do ser humano, mas que, ao tenta alcançar o
universal, pretende atingir também o individual. O cidadão da classe inferior
imitaria o da superior para se igualar a ele, enquanto, dialeticamente,
intenciona ter sua própria individualidade característica. Na superioridade
comum, esforça-se por descobrir seu próprio estilo.
Segundo as teorias do status ou gotejamento, portanto, a
Moda é criada no topo da sociedade e depois goteja, espraia-se para os estratos
sociais inferiores. Outros autores poderiam ser citados, mas a natureza do
espaço não permite.
Um questionamento final é que este modelo teórico não
explica fenômenos atuais em que as classes ditas excluídas utilizam-se de
vestuário e modos que depois são reproduzidos pelas classes consideradas superiores.
Esta análise merece um texto apartado em oportunidade futura.
Por João Ibaixe Jr. e Valquíria Sabóia
Publicado originalmente em Migalhas
(para ler no site, clique aqui)
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